“CONTE UMA
HISTÓRIA”
Ao meio
dia de uma
sexta – feira, sem nenhuma
ocupação naquele momento,
fui à barbearia
do amigo Zé
Barbeiro. Estando lá,
sentando em um
banco durinho, pois
é de cimento,
enquanto aguardava minha
vez, principiei, ainda que
superficialmente a observar.
Na minha mente,
um sensor foi atentando
para a singularidade
das situações que
ali se iam
desenvolvendo.
A barbearia
é simples, mas
ao mesmo tempo
é bastante agradável.
E isso somente
é possível pela
capacidade magistral de
seu proprietário, o
senhor José Ribeiro
da Silva, de
dominar uma arte
dificílima que é
cativar as pessoas.
É ele dono
de um carisma
enorme; posso até
dar o título
de artista ao
Zé Barbeiro. Posso,
pois ele sabe
como ninguém atender
a todos os frequentadores do seu
estabelecimento, gregos e troianos,
indistintamente. E veja
que a clientela
é tanta e
variada, desde o
homem do campo -
o lavrador, que
vem de longe
e que não
acha graça nenhuma
em deixar – se ficar
de cabelo grande,
e tem uns
que acreditam que
o cabelo grande
“enfraquece o homem”
e que podem
ser chamados de
“rabos de burro”,
até o “cidadão”
urbano, vaidoso e
preguiçoso, que procura
a barbearia do
Zé para limpar
a cara e
também com o
intuito de saber
das últimas -
as quentinhas, da
cidade, nos negócios,
no futebol, na
política e, não
podia faltar, na
vida particular dos
conterrâneos, nos mínimos
detalhes, numa troca
de informações, às
vezes, as mais
escabrosas que se
possa imaginar sobre
a vida alheia.
Lá também
vão alguns políticos
que falam de
suas decepções, suas lamentações;
Falam de colegas
vereadores, escalando – os como
corruptos e interesseiros; alguns
pabulam bastante, “contam
vantagem”. O destaque
aqui vai para
um velho político
que também frequenta
o recinto, sempre
com o seu
“chapéu de massa”
e é José
como o dono
da barbearia. “Seu” Zé
Costa, madeira de
lei e de
“dar em doido”,
experiente nas lides
políticas, é conservador
e conversador, tem
muitas histórias e
muito a ensinar
aos mais jovens.
Comenta – se que numa
campanha política, Zé
Costa, engasgado com
o resultado da
eleição, “mandou bala”
nos adversários; sabe – se
que morreu gente
até!
Mas,
enquanto
as conversas vão
acontecendo e se
cruzando, despercebidamente, o Zé Barbeiro
vai desempenhando o seu ofício.
Ao que chega,
ele diz: fulano,
conte uma história...e por
aí começa. Zé
é uma figura
ímpar: ouve a todos,
mesmo que o papo não
lhe interesse. Arriscaria dizer
que o amigo
Zé Barbeiro seria
extremamente útil em
Babel: ele entende
todas as línguas,
ou melhor todas
as conversas ou,
pelo menos, para
o bem do
seu negócio, procura
fazê – lo. Ele intercala
trabalho e prosa,
numa forma de
“prender” o freguês.
Vez ou outra,
pára a navalha
ou a tesoura
para cumprimentar ou
trocar uma palavra
com o transeunte
que passa na
calçada e que pára, momentaneamente, sob
a sombra benfazeja
da acácia. Sempre
conversando com a
pessoa que está
sentada à sua
cadeira, com a queixada
coberta por uma
baba, digo, uma
pasta branca. Concorda
ou discorda, dependendo
com quem fala
e do que
se fala.
Na hora
de pagar a
conta, Zé também se
supera: não é
careiro e, por
conhecer toda a
sua clientela, tem
um jeito para
tudo. Assim, o
“volte sempre” não
é preciso ser
dito. O cliente
volta, pois o
carisma é grande.
Há, ainda,
um detalhe: naquele
“ponto de encontro”
semanal ou quinzenal,
também existe espaço
para a cultura.
Zé Barbeiro,
também como forma
de ganhar o
freguês, deixa disponível
o jornal do
dia e a
revista Veja, para
os metidos a
intelectuais, e também
revistas de mulheres
peladas para entreter os
frequentadores ditos “mundanos”.
Escrito por Messias Costa, Rio
de Janeiro, março
de 1991.
Nenhum comentário:
Postar um comentário