quarta-feira, agosto 10, 2022

RIO COREAÚ: ENTRE LENDAS E HISTÓRIAS

 

RIO COREAÚ: ENTRE LENDAS E HISTÓRIAS

 

Vamos iniciar este passeio fluvial para conhecermos um pouco do Rio Coreaú. Geomorfologicamente é “considerado como um estuário do tipo planície costeira. [...] Próximo da desembocadura, na margem direita, ocorre uma extensão de praias e vasto campo de dunas, e à margem esquerda, está presente um conjunto de falésias vivas e o município de Camocim” . Contudo, nem sempre o rio foi chamado de Coreaú. Baseado nos escritos e mapas antigos já foi denominado de Comecy, Camocy, Camocim, Rio da Cruz, Curyhau, Croahú. Dizem que os índios que habitavam suas margens o chamavam de Croahiú, até chegarmos ao nome atual de Coreaú. Há até quem diga que o mesmo já foi chamado de Rio da Santa Cruz de São Francisco . Como se pode perceber, as denominações refletem a disputa da colonização da região, tendo-se vocábulos oriundos do idioma holandês, tupi e português. Aliás, a denominação portuguesa de Rio da Cruz parece ter sido a que mais durou nos tempos coloniais.

Num dos primeiros escritos sobre a nova terra conquistada e publicada já em 1587, intitulado "Tratado Descritivo do Brasil" de Gabriel Soares de Sousa, Camocim e o Rio da Cruz aparecem na descrição da costa cearense, enfatizando sua denominação: “Afirma o gentio que nasce este rio de uma lagoa, ou junto dela, onde também se criam pérolas, e chama-se este Rio da Cruz, porque se metem nele perto do mar dois riachos, em direito um do outro, com que fica a água em cruz”. (p.19-20). No entanto, não somente os portugueses descobriram a beleza do lugar e a potencialidade do rio. O processo de colonização da Capitania do Ceará pelos portugueses, como se sabe, se deu tardiamente. Essa demora, permitiu que outros navegantes explorassem nossa costa, como os franceses o fizeram. Quando os portugueses deram por si, sobre a possibilidade de perderem esta parte do território no começo do século XVII e enviaram a expedição de Pero Coelho em 1604 para a expulsão dos franceses da Ibiapaba, há muito os mesmos já negociavam com os índios as chamadas "espécimes de fauna e flora" da região. Por conta desse contato, os franceses quase sempre tinham a simpatia e a aliança das tribos indígenas e de seus "maiorais" (como eram chamados seus líderes) nas guerras de ocupação contra portugueses e holandeses. Os franceses, portanto, exploraram bastante o comércio com os índios Tabajaras da Ibiapaba usando nosso rio e logicamente fazendo essa rota conhecida em seus documentos náuticos e históricos. Como dissemos anteriormente, a expedição de Pero Coelho de 1604 acaba por expulsar os franceses da Ibiapaba iniciando efetivamente a colonização portuguesa na região. Contudo, com a invasão holandesa no território que se chama hoje de nordeste na primeira metade do século XVII, os holandeses, através da Companhia das Índias Ocidentais dominaram a região de 1630 e 1654, com o objetivo de controlar a região produtora de cana-de-açúcar, além de, explorar a terra em busca de outras riquezas. Neste sentido, os holandeses exploraram bastante a região do rio Camocim a ponto de terem erguido uma fortificação para melhor proteção de suas explorações na embocadura do rio, próximo à atual cidade de Granja, além de um outro em Jericoacoara.

Depois que o Conde Maurício de Nassau se instalou em Pernambuco mandou missões de reconhecimento ao Ceará para sondagem de suas potencialidades econômicas. Desta forma, Gedeon Morris confirmou a existência de boa quantidade de sal, âmbar gris e do pau violeta (tatajuba). O explorador holandês ainda fez referências a existência de 30 tribos tapuias e da excelência do porto para as atividades de carregamento de navios. Disse o explorador: "A expedição para Camocim valeu a pena. Gedeon Morris encontrou outra salina rendosa, distante da costa apenas 1700 passos. O porto prestava-se também ao carregamento de navios. Por outro lado, viviam nos arredores 30 tribos tapuias, das quais apenas dez eram aliadas aos holandeses. Por isso queria o zelandês (sic!) ir ao interior da região, a fim de atrair mais índios para os seus homens através de atitudes humanas e de bom tratamento. Também não esqueceu de preparar uma determinada quantidade de madeira corante para  exportação .

Já no começo do século XX, quando o porto estava no seu auge econômico, eram os marinheiros ingleses que aportavam por aqui com mais frequência. Um velho marinheiro nativo, o Sr. Euclides Negreiros, em depoimento nos disse: “Quando eu era menino, subia nos navios para vender laranjas e soins para os marinheiros ingleses (...) eu pegava os macaquinhos, dava de comer e amansava para vender prá eles”. Mas os ingleses não foram somente compradores de espécimes da nossa fauna. Os mesmos estiveram aqui quando da construção da Estrada de Ferro de Sobral. Acharam bom o negócio que depois uma firma inglesa arrendou a ferrovia através da The South American Railway Construction Company Limited, entre 1910 a 1915 . No entanto, a presença inglesa não ficou por aí. Nos anos 1940,  a Booth Line, empresa de navegação, explorou no Porto de Camocim o serviço de alvarengas, embarcações que faziam o serviço de embarque e desembarque dos navios em alto mar. À época, dizia-se que o porto de Camocim não tinha condições de receber os navios, até que o comandante do Navio Aratanha em 1946 pôs por água abaixo essa mentira que durou mais de uma década, a qual era reiterada pelo prático da barra e a empresa inglesa.

Continuando falando no século XX, a presença de americanos em nossa região começou com as exportações de algodão e borracha através do nosso porto, no chamado "esforço de guerra", contexto da Primeira Guerra Mundial. Sintomaticamente, é no entre-guerras que se dá o boom econômico e cultural da cidade. Já na Segunda Guerra Mundial, os americanos cogitaram instalar em Camocim um Posto de Comando, que afinal se fixou em Fortaleza, visto que a capital proporcionava melhores condições logísticas. No entanto, uma pequena base militar foi construída como ponto de apoio para as manobras militares, abrigando um grupo de militares americanos. Contudo, a maior estrutura logística da capital, Fortaleza, suplantou a vantagem geográfica que Camocim apresentava com relação à distância atlântica do Brasil entre a Europa e África. Base americana em Camocim. Acervo do blog. Por outro lado, a presença dos americanos entre nós pode ser percebida pelas lembranças de antigos moradores. Segundo o Sr. Antônio de Albuquerque Sousa Filho, a cidade “se tornou ponto estratégico importante, atraindo soldados norte-americanos e com uma base onde chegaram a atracar Zepelins”. Em suas memórias, o antigo morador salienta um clima de colaboração entre os soldados americanos e a população local, no que se refere às trocas gastronômicas, cuja novidade eram “as saladas de frutas em lata que os americanos distribuíam com as famílias da cidade, que por sua vez lhes presenteavam bolos”. Relembrando os escritos do imortal Arthur Queirós, a presença de celebridades americanas, mesmo que por algumas horas em solo camocinense, que cruzavam o Atlântico, nas frequentes paradas dos aviões da Panair, era um programa imperdível para os locais que tinham acesso. "Transitaram por Camocim, portanto, muitos notáveis, gente importante, do que mencionamos os artistas Henry Fonda (...) Greta Garbo, por aqui esteve por duas vezes, na última em 1943, exibindo-se para soldados e oficiais americanos aqui destacados, na Base Militar de apoio da segunda guerra mundial, que aqui construíram (...) transitaram ainda, Buck Jones, George O’Brien, Charles Starret, Sonja Henie e muitos outros... Dona Darcy Vargas, esposa do grande Presidente Vargas, por aqui transitou com destino à Norte América, ocasião em que muito aplaudida foi, pelos camocinenses. Passado o tempo das atividades econômicas proporcionadas pelo porto e a ferrovia, o desenvolvimento do município de Camocim, na última década do século XX, passou a se vislumbrado pela atividade turística. Neste sentido, mais uma vez os estrangeiros tiveram a iniciativa de explorar este setor, principalmente os italianos. Numa tese de doutorado, o ex-professor do Curso de Geografia da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA, Lenilton Francisco de Assis nos diz: Os empresários italianos passaram a frequentar Camocim como turistas, a partir de 1996. Logo, perceberam que o potencial natural e arquitetônico do município somado aos incentivos do Poder Público poderiam gerar bons negócios imobiliário-turísticos. Para tanto, a primeira ação dos empresários foi comprar grandes faixas de terra no litoral onde pudessem viabilizar seus anseios e atrair novos investidores. Em poucos anos, o grupo italiano já dispunha de aproximadamente 1.600ha de terras em Camocim (equivalente a 1,4% do território) grande parte sendo praias desertas e pouco habitadas que, até então, funcionavam como territórios de reserva, ainda sem ou com pouca valorização. Terrenos planos, com vistas privilegiadas para o mar e o rio Coreaú, foram adquiridos, a preços módicos, nas praias das Barreiras, Maceió, Caraúbas e do Farol, assim como nas proximidades da antiga área portuária e em outras partes do município – como no distrito industrial criado no Plano Diretor de Camocim. Afora estas questões, a magia do rio ainda encanta poetas, inspira histórias e lendas de pescadores e velhos marinheiros, além de emoldurar cenários típicos, próprios para os enamorados e visitantes em busca de uma bela paisagem para curtirem.

Ficamos, pois, com a sensibilidade do poeta camocinense Inácio Santos, como despedida deste passeio, que esperamos que todos tenham gostado: SEDUÇÃO É o mar que adentra ao rio Ou o rio que adentra ao mar É uma incógnita este desafio Ninguém consegue explicar E neste embate aguerrido De força e de grandeza Exprime todo o sentido De luz, magia, e beleza Também não há explicação Da indescritível emoção Que se apodera de mim Meu coração se faz mar Lá aonde vai desaguar Meu lindo rio Camocim.

Inácio Santos II SIMPÓSIO DE CAMOCIM: língua, história e ensino. Atividade: Passeio Cultural: Rio Coreaú: entre lendas e histórias. Guia: Prof. Carlos Augusto. História/UVA.

Fonte:  CAMOCIM  POTE DE  HISTÓRIAS.  Blog

 

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TATIANNI CARNEIRO CRUZ escreveu

  Está  no  Trabalho  de  TATIANNI  CARNEIRO  CRUZ