ABDELKADER
MAGALHÃES, ADVOGADO
( Raimundo Magalhães Júnior )
pernas, somente até os tornozelos, sapatos de
bicos agressivamente finos, não raros de duas cores, chamados de
"camouflage": pretos e brancos, marrons e brancos, ou apenas
brancos. 0 chapéu tipo "palhinha" completava a indumentária, em
um e outro caso complementado com uma bengala. Os cabelos, penteados para
trás, fixados à força de "brilhantinas". Falava-se muito em
"bolina", forma de toque de sentido sexual primário na es curidão dos
cinemas ou nos raros namoros de portão. Os "filmes" foram
divididos em partes e um leve toque de campainha "notificava" que as
luzes estavam acesas. Era a hora de retirar ansiosamente o que se chamaria
depois de "mão-boba" que, aproveitando o escuro, estava acariciando
um seio ou pousada "acidentalmente" na coxa da namorada. Não era
incomum o namoro de sobrado, o "almofadinha" lá em baixo, na rua, e a
"melindrosa" na sacada, repetindo, séculos depois, a cena do balcão
de "Ro meu e Julieta". Se era rua por onde trafegava os bondes,
o fim de conversa era marcado pelo movimento do namorado pegar o bonde andando:
era prova de masculinidade pegar os bondes em movimento. Não havia bailes
de clubes, a não ser raríssimos promovidos pelo "Casino" (como sim
mesmo com um "esse" só) ou pelo Clube Macarroni. Os bailes eram
realizados em casas de família e certas "almofadinhas" tinham faro
apuradíssimo para descobri-los. Os boêmios eram Gastão Machado, Lobinho,
Luiz Florenzano Balbi, Plinio Machado, Raimundo Magalhães Júnior (futuro membro
da Academia Brasileira de Letras, escritor famoso, à época redator de
" brasileiro ao Sul-Americano de 1923, em Montevidéu, recebeu o
convite para participar das Olimpíadas de Paris. Amáro Silveira foi
escolhido pelos jornalistas que cobriam o Sul Americano como a ponta esquerda
da seleção do certo, apelidado de "el chico de oro", pela imprensa
uru guaia. E em "A Notícia" de 20 de março de 1924 está
registrado o convite dirigido 214
Duas figuras Em julho de 1924 chegava a Campos
uma figura que marcaria de modo indelével a sua presença extraordinária pela
obra sócio-cristã aqui durante cerca de 40 anos. Era o apostolar Monsenhor
José Severino, imagem de santo-profeta com suas longas barbas brancas e seus
olhos muito azuis. Missionário na África por quase 20 anos, ele conheceu o
ilustre historiador campista Alberto Lamego, em Londres, no final da Grande
Guerra de 1914. Lamego logo o convidava, desde lá de Londres, para vir morar em
Campos e aqui continuar o seu trabalho apostólico . Não era o "padre
Severino" português como muitos supunham por conta de seu sotaque de quem
vivera longos anos na África portuguesa. Nascera no Rio de Janeiro, em
1867, e cursara o Colégio Pedro II. Depois o Seminário Patriarcal e em
seguida fora professor no Colégio Santa Maria, tendo como um dos seus
alunos o campista Obertal Chaves, que viria a ser Promotor em Campos. Em
1896, ele seguiu para a África, percorrendo o Congo e Angola, onde viveu como
missionário durante 17 anos. A convite do Governador de Angola realizou excursão
pelo rio Cunene, tomando posse para Portugal das regiões de Donguena e
Hinza. Em 1913 rumou para Cabo Verde, São Tomé, Príncipe, Ilha da Madeira,
Portugal, Espanha, França, Bélgica, Holanda e Inglaterra. Esteve com o
Papa e depois veio para o Brasil. Mas não veio direto para
Campos. Antes fundou e dirigiu a Escola para Menores Abandonados, o
Orfanato São Bento e Asilo São Luiz, este em São Cristóvão, todos no Rio de
Janeiro. Chegando a Campos em julho de 1924, logo fundava o Orfanato São
José, a Caixa Escolar e o Abrigo dos Pobres, que tem o seu nome. O
Orfanato acolheu logo 250 meninos abandonados, que passaram a ter educação,
ensino, alimentação, ginástica e educação musical. Exímio músico,
monsenhor Severino criou a bandinha do Orfanato que se tornaria uma das
instituições mais populares e queridas dos campistas. Exibia-se em toda
parte e abrilhantava os jogos de futebol. Entrava em ação a cada gol
marcado mas o povo dizia que com maior animação quando o gol era do Goytacaz...
O Orfa nato formou para a vida útil muitos campistas. Tinha oficina
mecânica, tipográfica, sapataria, etc. O Orfanato São José foi a maior obra
social que teve atuação em Campos. O "padre Severino" deixou
livros sobre viagens e falou vários idiomas e dialetos africanos. Deixou
mesmo uma gramática do idioma Olumyka. Era sócio da Sociedade de Geografia
de Lisboa, da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro, do Atheneu da
cidade do Porto, Portugal; e do Instituto Histórico de São
Paulo. Faleceu em Campos, em 8 de dezembro de 1943. Seus funerais foram
imponen tes. O povo levou o caixão do hospital da Beneficência à Matriz de
São Salvador, onde o corpo foi encomendado pelo Bispo D. Otaviano. No
Cemitério do Caju dis cursaram Alberto Lamego e vários outros
oradores. Terminado o Censo de 1920, por aqui ficou um funcionário do
mesmo, que, desempregado, pegou o posto de revisor da "Folha do
Comércio". A tônica do jornalismo do tempo era o "artigo de
fundo", de acentos fundamentalmente políticos, 219 O povo levou o
caixão do hospital da Beneficência à Matriz de São Salvador, onde o corpo foi
encomendado pelo Bispo D. Otaviano. No Cemitério do Caju discursaram
Alberto Lamego e vários outros oradores. Terminado o Censo de 1920, por
aqui ficou um funcionário do mesmo, que, desempregado, pegou o posto de revisor
da "Folha do Comércio". A tônica do jornalismo do tempo era o
"artigo de fundo", de acentos fundamentalmente políticos, 219 O
povo levou o caixão do hospital da Beneficência à Matriz de São Salvador, onde
o corpo foi encomendado pelo Bispo D. Otaviano. No Cemitério do Caju discursaram
Alberto Lamego e vários outros oradores. Terminado o Censo de 1920, por
aqui ficou um funcionário do mesmo, que, desempregado, pegou o posto de revisor
da "Folha do Comércio". A tônica do jornalismo do tempo era o
"artigo de fundo", de acentos fundamentalmente políticos, 219
Biblioteca de ESTUDOS FLUMINENSES
não raro vazado em linguagem veemente e até
desabrida. Quem o redigia no mencionado jornal era Thiers Cardoso, o
musicista da "Marcha Brasil" e que seria de pois deputado
federal. Thiers adoeceu ou manteve-se inesperadamente e José Carlos
Pereira Pinto, presidente da Associação Comercial e automaticamente diretor de
"Folha do Comércio", pôs as mãos na cabeça; quem iria redigir o
"artigo de fundo"? Foi quando o revisor anônimo se ofereceu para
a tarefa. Zé Carlos mirou-o, descrente. Mas o cidadão insistiu: era
quem revisava os artigos, conhecia a linha política do jornal, deixasse que ele
tentasse. Escreveu. Uma beleza. Melhor do que os artigos do
Thiers Cardoso. Então o Zé Carlos apertou o homem, que se identificou: era cearense, advogado e escondera esta condição
envergonhada por ter que apelar para o emprego eventual de funcionário do
Recenseamento. Era Abdelkader Magalhães, cujo talento brilharia em
Campos. Mandou ele, então, buscar dois sobrinhos no Ceará. Um era o
Raimundo Magalhães Junior que se tornaria figura de destaque nos meios
literários nacionais, membro da Academia Brasileira de Letras. Estudou no
Liceu e começou a carreira jornalística na "Folha do
Comércio". Abdelkader Magalhães brilharia no Foro de Campos como
advogado e seria eleito deputado esta dupla. Era um homem de grande
talento. Em 1930 a tragédia se fez presente em sua vida: matou ele um
pacato alemão, mecânico da Fábrica de Tecidos, crime cometido sob uma ação de
excessos etílicos. Desapareceu o dr. Abdelkader, vivendo sob nome suposto
no interior de Goiás, só revelando sua verdadeira identidade na hora da
morte. O triste episódio aconteceu em 1930 e Raimundo Magalhães se mudou
para o Rio, onde começaria no vespertino "A Noite" sua vitoriosa
carreira de jornalista e escritor. Infelizmente — e o fato não tem
explicação — como que riscou Campos de sua biografia, guardando mágoa da cidade
que o acolheu, coisa que não fez nunca nenhum sentido.
Biblioteca de ESTUDOS FLUMINENSES, a fonte
Nenhum comentário:
Postar um comentário