Um autor, do principio da literatura brasileira, que considero de muita importância: padre Antonio Vieira. Quem conhece a sua escrita está bem; quem não conhece, precisa urgentemente ler os seus SERMÕES e CARTAS. O Sermão intitulado "Amor e Ódio" está aí, para o deleite do blognauta:
"As paixões do coração humano, como as divide e enumera Aristóteles, são onze; mas todas elas se reduzem a duas capitais: amor e ódio. E estes dois afetos cegos são os dois polos em que se revolve o mundo, por isso tão mal governado. Eles são os que pesam os merecimentos, eles os que qualificam as ações, eles os que avaliam as prendas, eles os que repartem as fortunas. Eles são os que enfeitam ou descompõem, eles os que fazem ou aniquilam, eles os que pintam ou despintam os objetos, dando e tirando a seu arbítrio a cor, a figura, a medida e ainda o mesmo ser e substância, sem outra distinção ou juizo que aborrecer ou amar. Se os olhos veem com amor, o corvo é branco; se com ódio, o cisne é negro; se com amor, o demônio é formoso, se com ódio, o anjo é feio; se com amor, o pigmeu é gigante; se com ódio, o gigante é pigmeu; se com amor, o que não é tem ser; se com ódio, o que tem ser e é bem que seja , não é nem será jamais. Por isso se veem com perpétuo clamor de justiça os indignos levantados e as dignidades abatidas; os talentos ociosos e as incapacidades com mando; a ignorância graduada e a ciência sem honra; a fraqueza com bastão e o valor posto a um canto; o vício sobre os altares e a virtude sem culto; os milagres acusados e os milagrosos réus. Pode haver maior violência da razão? Pode haver maior escândalo da natureza? Pode haver maior perdição da república? Pois tudo isto é o que faz e desfaz a paixão dos olhos humanos, cegos quando amam e cegos quando aborrecem; cegos quando aprovam e cegos quando condenam; cegos quando não veem e quando veem muito mais cegos."
Sermão da Quarta - Feira, Lisboa, 1669
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